quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Madrugada

''Meus pêsames'', ela se pronunciou.
De alguma forma a Madrugada sabia da morte mais recente de minha primavera, e estava perceptivelmente feliz.
(Salafraia!)
Com toda sua sutileza vulgar, ela me apresentou uma vez mais o poço que mora em meu peito. Era profundo, lamacento e escuro. Uma brisa fria atingiu meu rosto e, de repente, a paisagem espacial a minha volta pareceu balançar à deriva de uma ventania invisível. Seu movimento brusco aos poucos formou um redemoinho. Tentei me afastar, mas lembrei de que não tenho controle de nada quando estou neste plano.
O estranho redemoinho estrelado começou a se aproximar demasiadamente. Voava sem freio como um cometa japonês, justamente em direção ao rombo que havia entre minhas costelas. Tentei fugir novamente, mas não obtive sucesso. Quando ele encontrou meu poço, deformou-se, e todas as estrelas que carregava despencaram e preencheram o local onde deveria se encontrar meu miocárdio. A fenda fechou e cicatrizou com as estrelas dentro, e de alguma forma ceifou parte de minha dor. Procurei um rosto para o qual pudesse dirigir um olhar ou sorriso de gratidão, mas não avistei nada além de uma escuridão enfeitada com pequenos pontos de luz.
E, de repente, como se um deus sem rosto tivesse estalado os dedos para quebrar a hipnose, a paisagem à minha volta se desintegrou. No momento seguinte eu estava olhando deveras confusa para o teto do meu quarto. Não tentei esclarecer o que havia acontecido, e senti uma imensa vontade de voltar para o vazio do espaço, de escutar o riso das estrelas.
Dentro de pouco tempo descobri o porque da fuga de minha dama. O sol. O sol que saldou os meus olhos a afugentou, e me fez odiá-lo uma vez mais.
Minha dama, volte. Minha Madrugada.
Madrugada que permite que eu aproveite cada segundo de silêncio.
Como um monstro que não pode ver a luz, eu gostaria que durasse para sempre.

Nenhum comentário:

Postar um comentário